domingo, 28 de abril de 2024

Ciclo de pedra e de luz

Assim se inicia o novo ciclo da vida



tecitura de pedra sob a

varanda do olhar.



Tela de ponto cruz

ou loja de conveniência



sobras de tintas sob o tapete

da porta de entrada.



Filtradas pelo verde da pérgola

candeias azuladas de uma

luz esquecida



germinam ventos e searas

em aromas de fim de tarde



e estendem raízes no poema.



Sobressaltos de crepúsculos entrelaçados

em fugas de maios prometidos.



Limpam-se as ervas daninhas para

que permaneça a certeza



da textura lisa

da pedra fria.






BL

28.04.24









terça-feira, 23 de abril de 2024

As estrelas também comem


 



Uma rua onde viver não fosse

a travessia do silêncio

nem uma rota de versos



solitários

ou um refrão de muros em ruínas

com a fome a descoberto.



O amor não chega por acréscimo

nem se reescreve numa pauta



de areia

a sobreviver ao tempo.



Uma rua onde um

champanhe partilhado anunciasse

a cegueira da pele e aninhasse



a loucura do corpo.



Uma rua onde os paralelos

do espanto não esquecessem a voz e



resistissem a um vendaval de

incertezas.





BL

23.04.24





Doces melodias

 




Chama-me o crepúsculo

para dentro de mim.


São de ouro e azul

as doces melodias

que me segredam de ti,

sussurros da tua voz,

com a luz do outrora

que não quer partir.


Suspensa num arco-íris de azuis,

desenho na minha alma

o que não posso querer,

na intemporalidade

de um momento

que é só nosso,

teu e meu,

e sem regresso.


Esta noite, recuso amanhecer.





BL

25.08.2009










terça-feira, 16 de abril de 2024

Dança de roda

 





E a esta distância
nos meus olhos de agora
existe uma dança
uma dança de roda

era uma esquina
de anos antigos
lugar de encontros
de anos mas poucos

elas sorriam
eles queriam
a ficarem loucos

e eu a um canto
pequena
encostada
sem perceber nada.



BL
16.04.24










terça-feira, 9 de abril de 2024

Entre o céu e a terra

 



Um eco
uma melodia
notas soltas flutuam no ar
pétalas ao vento dispersas
sem rumo
a vida a caber no poema
pegadas de presenças entre ramos e folhas.

Entre o céu e a terra
a luz preenche o silêncio
um acorde
um suspiro
e na alma uma súbita ordem noturna
a percorrer a existência
a redescobrir as nuvens
e os crepúsculos.

Um eco
uma melodia
para além das palavras sufocadas na boca
a transcender o tempo
mesmo sendo morada anónima
sob o olhar do infinito.




BL

08.04.24









segunda-feira, 8 de abril de 2024

Lá fora, cala-se a chuva

 


Lá fora
um claro-escuro imutável
como se o amanhã encenasse momentos
ocultos em cada domingo.
Todos os momentos são perfeitos para serem nuvens
eterna é a força do tempo
mas só agora me permito ouvir o silêncio
e libertar o corpo do desassossego das horas.

Adormeço ao sabor do vento
aguardando o ruído da vida
que sufoca sob um rio enregelado
e um céu crispado de solidão.

Lá fora
cala-se a chuva
e eu sento-me no horizonte a vender sonhos
a amadurecer versos
a partilhar as cores de um nada
entre o gélido olhar do infinito
e a sílaba ancorada nos mares desérticos da Lua.




BL
10.07.2011








quarta-feira, 3 de abril de 2024

Não há dunas sem vento

 




Nas vastidões de areia


e eras


onde o sol se funde ao céu

em chama viva



não há dunas sem o sussurro do vento

sem a carícia eterna

da sua coreografia.


Elas ascendem

imponentes

ao firmamento

esculpidas pela sábia mão

do sopro leve


contam histórias de nómadas

e estrelas

de paixões ocultas

dispersas na imensidão.


O vento

escultor sem forma

ou rosto

desenha linhas de vida e movimento


em cada grão uma memória

um pensamento


na areia

o palco da sua silenciosa canção.


As dunas vivem e morrem

ao capricho do vento

que as embala


não há dunas sem vento

sem a força que as desafia


sem a brisa que as molda

e as convida a dançar

ou as faz transformar.




BL

03.04.23












Labirinto

 






Percorro corredores a perder de vista

cada passo é uma escolha
cada escolha
um enigma.

As paredes não sussurram segredos
fecham-se
vigilantes.
Testemunhas mudas de um possível degredo.

A luz oscilante
frágil
inconstante
mas bastante

para desvendar o caminho
não o destino.

O labirinto não condena
não conduz

meramente se reduz a

um desafio à perceção
à determinação
ao instinto.

Neste lugar onde o tempo parece
parar
cada momento é eterno
cada decisão irrevogável.

Não há começo nem fim
somente o presente
e a verdade que emerge quando
já não é provável.

O labirinto é existir
pensar
refletir

um ressoar dos passos
que nos definem.

A viagem não busca uma saída
mas sim o entendimento de que
no final
cada um de nós é
em essência 
um labirinto.





BL
03.04.24













terça-feira, 2 de abril de 2024

Ecos do mar: versos de saudade e silêncio

 





Serei sempre o murmúrio das ondas

e do silêncio profundo que nelas habitava.


Caída sob o calor de mãos ardentes

engolia um vazio salgado

sinopse dolorida de todos os dias.


Na memória ressoam passos sobre pedras frias

traçam-se lamentos

na névoa que o mar respirava.


E na calmaria da noite

que vasta se desdobra

em horas solitárias

tardias


o coração bate

em versos soltos

que carregam histórias de amores esquecidos.


Risos e lágrimas cruzam

os murmúrios do vento

águas abissais

onde encontro refúgios


resposta do tempo

à voz paciente

que em mim se aquietava.



BL

02.04.24