quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Semeador de infinitos



Deixa-me chegar perto.
Reinventar palavras antigas
e assumi-las
na primeira voz da manhã.

Magoada
talvez
cansada do silêncio do olhar
ou de um espaço inajustável
à epiderme da luz.

Tão frágil
a vida.
Um rio suspenso sobre a tela
a antecipar os braços fortes
do pintor.

Deixa-me pronunciar a cor
sem sobressalto
e deslizar um tempo vigilante
por dentro da raiz inicial.

Semeador de infinitos
poderás invocar o traço original.

Nascente e foz da utopia
movimento da voz
a crescer sobre as paredes da memória.

A aceitar o secreto e imperecível apelo da casa.

BL

sábado, 24 de agosto de 2013

Estiagem


Lembrar-me-ei de ti
como um azul vagabundo

como a súbita aragem
que transitória passa
sobre a estiagem das coisas.

Tão ilusório
e belo
como o íntimo refluir
da primeira palavra de amor

ou a mútua cumplicidade
de um silêncio.

BL

domingo, 18 de agosto de 2013

A metamorfose do fogo



Há um lado arrastado
hoje.
Molda a linguagem do sorriso
risca o azul de um céu
ocupado pela informe passagem da Lua
corpo inexplicável de ausências e memórias.

E os melros. Testemunhas da tarde a arrumarem o tempo.

E a dizerem-me de ti.

[ em teus olhos
de silêncio
a inocência
de palavras inequívocas ]

P’ra lá dos girassóis
a suspensão da luz
na imóvel floração dos aloendros.

E a vastidão da cal.
A metamorfose do fogo

na branca ondulação das borboletas.

A dizerem-me de ti.

[ aqui
entre a lenta desconstrução das horas
e a (in)quieta reconstrução dos dias ]

BL

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Serenamente, o silêncio



Passeio os dias
a curar a acidez dos espelhos. Palavras de água
abrigam sombras transitórias e são
talvez
à vez
degraus de espuma
ou estalidos do tempo.

Crepúsculos de adolescência cantam
a pele do vento
em longínquos horizontes de mar.

Há ilhas de agosto
a soprar a solidão da pedra
em olhos repletos de verdes conformados

a preparar a linguagem da casa
para a jornada seguinte.

Depois
serenamente

o silêncio.

BL

sábado, 3 de agosto de 2013

Sabor a mar



Aceito todas as dúvidas que me atravessam
nos nomes concretos que me prendem às manhãs.
Quase sempre antecipo um anel de sol
a evitar a migração dos pássaros.

Adentro-me pelas marés
e deixo-me alcançar pela espuma do tempo
a arrastar-me para longe das escarpas.

Recordo os vagalumes que refulgiam das areias
o silêncio das águas que nos tinham
a sede inesgotável onde cabíamos.

Quem mutilou o ondular do vento
as palavras da noite em inconfessos movimentos de linho?

Admiro as árvores que aceitam vestir-se de inverno;
conjugam o amor e sabem a.mar em todas as estações.

BL