quinta-feira, 31 de julho de 2014

por aí...




A árvore
ou o silêncio de um ninho no interior de um ninho
a um grito da queda.


O tronco
mirrado. Como quem
se deixou tombar por dentro. Uma ave
abrigada entre folhas e ramos
a debicar o pensamento.


Os olhos
a seguirem o rumo
da seiva a espalhar-se
pelo tempo. À procura
da primavera
no fundo do mundo.


BL

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Um lugar acima de nós


Espero ainda por ti

à beira de uma raiz do olhar. Como quem



envolve a alma na memória e se agarra

ao tempo quieto

que vem de dentro. Falo-te



da voz que os pássaros abrigam nas falésias

ou dos cabelos encrespados do mar. E o silêncio

a crescer acima de nós



a devolver-nos o dialeto do vento

voz da tua e da minha voz.



E o tempo acima do vento

mil anos acima de nós.



E os teus passos

os teus passos curvados



a desenharem na sombra a direção da luz.



Luz em fuga

no desencontro dos tempos.



Lugar

das coisas indizíveis



tão perto da voz.



BL

terça-feira, 15 de julho de 2014

Um nome que te dói


 
 
Um nome que te dói. Que te ocupa

todos os espaços do corpo e que talvez



só exista dentro de ti. Cheio de aves

e dos incêndios do entardecer.



Talvez destinado a morrer.

Como tu morres ao despertar da manhã



e o silêncio é teu refúgio de barcos

e de tempestades.



Um nome que te dói. Que não te sabe

a inocência das estrelas. Onde o tempo



cresce e a memória te molda a alma

na geografia do corpo. O teu corpo



exausto. A luz inerte de um rosto vazio.



BL

terça-feira, 8 de julho de 2014

Convergências


Sei que é tangível

a cumplicidade da palavra.

Clamo-a

agora mais do que nunca

para que nada mais se cumpra entre mim

e esta solidão cinza-violácea

que desce pelo anoitecer e respira

por dentro das paredes.

A saudade, tu sabes.

A casa embebida de longes.

A lentidão dos dias que passam.

A luz das pequenas coisas

simples e inadiáveis

suspensas nas intermitências da voz.

Espaços em branco

em redor do meu corpo. A fragmentarem

o movimento de um tempo que vem de fora

e demora a chegar.

BL

sexta-feira, 4 de julho de 2014

Num fio de palavras [des]convocadas


 
Levamos o tempo fechado no olhar

como se gritássemos sombras silenciosas

paradas no esquecimento.

Através dos corpos emudecidos

passam os dias turvos de ausências

e de solidão.



E ao redor da casa envelhece

uma tranquilidade baça

por onde se afundam os gestos vagos

a sucumbirem na fuga.



Convoco o vocabulário

da ressurreição

a plena vastidão do amor

para dentro das imagens



mas sei apenas de um quase nada

sempre que viro a página

e o rio reflui e me engole



[ ou me adia ]



e a linguagem da pele quase não passa.



BL

13.06.14