segunda-feira, 14 de março de 2022

O silêncio é vertigem



 Uivos de fogo derramam relâmpagos

sobre o rio amarrado às margens.

Os instantes de luz ferem os ponteiros da cidade

engolida no espanto da sombra.

Dói o rosto da noite

a estremecer desde o ventre da terra.

O silêncio é vertigem

onde a morte sem nome se acomoda.

Nas palavras confundem-se abrigos

e tumultos de viagens derradeiras.

A casa

o caos.

Mapas de limbos na permanência dos dias

ou voos extasiados no orvalho dos olhos.


BL

14.03.22








sexta-feira, 4 de março de 2022

Vocábulos indizíveis

 

Na pele

os escombros das manhãs

uma esperança fugaz ou os desvios de alguma outra

tecida na turbulência do peito.


Reaprende-se o colo em que se acorda

dos ardis profundos da noite.


Na verdade dos olhares

os vocábulos indizíveis

a dor desnuda da recordação dos pássaros.


Um fumo denso apaga sinais de sorte

e o mundo revela-se letal e desabitado.


Verte-se o sangue de um futuro adiado

e guarda-se em sementes de nevoeiro um simulacro de sol.


BL

03.03.22








quarta-feira, 2 de março de 2022

Parede de sangue

 

A inocência perdida numa parede de sangue.

A alma a respirar a noite profunda

no esforço de combater a morte.

O olhar

líquido

parado lá atrás

na contemplação do amor aberto aos gemidos da terra.

Pássaros perdidos

a procurarem entender o que está

para além da sua ausência.

Nas mãos

o silêncio.

O silêncio iluminado de um coração de pretéritos

ou o silêncio náufrago do inverno incisivo do futuro.


Tantos olhos

para onde nenhum barco regressa.


BL

01.03.22