avassalador o silêncio
rasga o tempo suspende o eco
tudo oculta e tudo revela.
BL
30.04.25
avassalador o silêncio
rasga o tempo suspende o eco
tudo oculta e tudo revela.
BL
30.04.25
O cansaço das pálpebras
um mundo fechado em sombras
um suspiro de luz perdido
no labirinto do tempo.
BL
29.04.25
Existe
nas entranhas do mundo
um rio adormecido
submerso na pele da terra
um murmúrio contido
o silêncio a respirar
na cadência imutável do tempo.
O vento não grita
sussurra
rasga suavemente o véu da inquietação
um olhar atravessado de sombras.
As árvores não dançam
em desespero. Dobram-se
num gesto antigo
acolhem nos seus ramos o peso indecifrável do céu.
E no intervalo entre o caos
e a pausa
no espaço onde o eco abdica de gritar
habita a tranquilidade
[ reflexo opaco no espelho do universo. ]
Há mares que se estendem além do olhar
vastidões de quietude infinita . Abraçam memórias
impronunciáveis
sussurram histórias
sem pressa.
É densa a serenidade do instante
uma pedra a repousar
no centro da alma
a vibrar
na essência do horizonte.
BL
27.04.25
Ferem-me faróis em ruas decadentes
reflexos distorcidos
que sangram nas calçadas
onde o asfalto se rompe
sob o peso de passos perdidos.
Fétidas esquinas putrefactas
abismos a engolirem esperanças desfeitas
murmúrios de histórias
a apodrecerem no silêncio.
Suspiros de moral violada
pairam como vultos invisíveis
entre vestígios de convicções corroídas.
Gasta?
Ou talvez transformada
num ciclo infindável
entre queda e renascimento
onde o ar exala o aroma
acre da decadência
mas ainda hesita
num fluxo perpétuo
onde o esquecimento consome o que sobra.
BL
27.04.25
É aqui que te encontro.
Num relâmpago surdo
cicatriz do céu que incendeia memórias
ou naquelas flores amarelas
de fogo
centelhas efémeras da eternidade.
A casa era grande
um oceano de ausências
paredes pintadas de solidão
e
entre sombras e silêncio
o meu nome ecoava
quando o pronunciavas
com a tua voz
de tal maneira rouca
que a tarde inteira se derretia
e
sobre a terra
um voo frenético de asas descompassadas
agigantava-se
num encontro feroz com a luz.
Uma dança entre o fogo
e o crepúsculo.
BL
26.04.25
Matei memórias de futuros sonhados
enterrei esperanças em terra infértil.
Cravei dardos no horizonte
as mãos trémulas de revolta.
Gritei medos sufocados
lâminas invisíveis do silêncio.
Caminhos apagados pelo tempo
traços desfeitos pela fúria do vento.
Sonhos jazem
esquecidos
cadáveres
sob o véu da noite eterna.
De que serve sonhar
se a madrugada sangra mentiras?
De que serve acordar
quando cada raio de sol queima memórias?
Deixem-me dormir
afundar no negro abismo do repouso.
Deixem-me repousar
nos contornos do silêncio
nos escombros da ilusão.
BL
Queria ter o tempo
de ser eu,
para poder ter-me
e me poder dar-te.
Para ser só uma
e não várias,
e tão outras,
em uma só.
Queria ser igual
e saber ser,
todos os dias.
Queria recusar-me,
ou aceitar-me.
Não fujo
porque eu quero
e o meu regresso
não está em mim.
Queria ficar,
mas não me pertenço.
Para quê fugir,
se me levo
sempre
comigo?...
BL
Uma cidade longínqua
já escassa
vai-se despindo por dentro
desfaz-se no amanhecer
semi-dormida.
Respiro a aragem extinta da noite
sou célula
pulmão
artérias que se dissolvem
na penumbra.
Sou o silêncio no horizonte
ecos do tempo em cada esquina
passos dispersos na poeira dos dias
rosto esquecidos em janelas abertas.
Sou destino
cruzo mares.
Levo na pele a marca da travessia
[ o sal colado à memória ]
orla de instante
que nunca se fixa.
Sou vaga
sou sombra
vertigem
e despedida
o regresso do vento
e das palavras não ditas.
BL
23.04.25
No reverso do vento
existem sopros de ecos inconfessos
como
se o silêncio devorasse o canto dos corvos
e
em cada folha de outono
rasgasse
a fenda invisível entre a saudade e o grito.
Caminho por linhas fragmentadas
onde a luz vacila
hesitante
manchando de sombra o rosto do tempo.
No reflexo das águas antigas
renascem vozes que morreram
cartas jamais enviadas
flores a sangrarem cores
que o esquecimento não consome.
O tempo dobra-se sobre si mesmo
e eu
dobrada nele
sou presença e sou distância
sou voo
onde tudo o que sou
se perde
e se refaz.
BL
22.04.25
Fiapos de luz
trémulos
contidos
trazem-me a infância de filas sem fim
uniformes rígidos
passos contados
espera por tudo
e por nada.
Narizes afiados
sob panos escuros
pendiam
imponentes
sombras inquisidoras.
Sorrisos enviesados lançavam metamorfoses ao vento
escorrendo por corredores estreitos
em cada saída uma lâmina.
Tinham o queijo e os moldes
receitas de ferro e de fogo.
Regiam ritmos inaudíveis
e
corre corre corre gritavam vozes.
Mas eu tropecei.
Fiquei para trás.
BL
21.04.25
Um silêncio noturno habita
formas ainda sem nome
carrega horizontes em dobras de
mel e granito.
Ao fundo
fragmentos do passado
raízes que descansam em sombras de pó.
Entre nuvens e sorrisos
uma janela cansada
e a árvore caça-sonhos a correr
em direção à madrugada.
Não há mar que a aparte do vento
à espera de que o poema se mostre
por dentro.
BL
20.04.25
Conduzo os meus passos
num curso de horas sem voz
ecos do silêncio
de um tempo que não me pertence
[ que nunca escolhi
e me persegue ]
As sombras arrastam-se
no ventre do vento que murmura a partida
[ refazem-se numa brisa antiga ]
escondo nas palavras as arestas
de uma luz esquecida.
Sobra um fogo que persiste
um brilho discreto à margem dos dias
um lampejo rebelde que ousa ainda respirar.
Os céus pesam de ausência
e a noite desenrola-se sem promessas.
E escrevo. Sílabas de asas trémulas
onde sou inteira
[ por detrás dos dias imóveis ]
tecendo nos intervalos das horas
um mapa de regresso à pele que me envolveu.
BL
19.04.25
Nas minhas memórias me vou encontrando
nos ecos suaves de um verso brando
onde as águas do tempo
em fluxo incerto
revelam o que foi acerto
e o que foi deserto.
Às vezes
sou sombra
sem sentido
vagueio perdida
longe do abrigo
reflexo distorcido de uma crença antiga
que já foi porto
e agora
é névoa amiga.
Deslizo em silêncio
passo sem ruído
entre o sonho e o real
sigo decidida
e na curva do tempo onde tudo se alinha
encontro em mim mesma
a luz que caminha.
BL
18.04.25
A solidão que repousa nos olhos
este vazio tão antigo
tão magro
uma linha de água a arrastar-se no tempo.
O tempo
impassível
a moldar o silêncio.
Rotas de dor e de coragem
latentes.
E o passado a sussurrar
vozes persistentes.
Fui sonho
e batente de porta
às vezes punho cerrado
às vezes coração disfarçado.
Avisos amarelos de disrupção da alma
este oceano inquieto
ondas que afagam e ferem
esta dança lenta entre sombras e luzes
a dissolver-se
sem nunca partir.
BL
15.04.25
Todas as casas têm raízes
que não quebram.
Afundam-se
órfãs
na pele do silêncio
como se fossem sombras de um poeta
[desses que sangram versos sobre as pedras
a desenharem asas onde há ruínas
cantando por aqueles que são esquecidos
os que perdem os nomes
e a caligrafia pálida do tempo.
Todas as casas respiram o vazio.
Ecoam
mudas
na noite aberta
enquanto o amor
com olhos fechados
tateia a ausência
e dissolve o fogo nas veias.
Todas as casas escrevem sem mãos.
Gravam
cegas
histórias sobre o vento
por não saberem caminhar sozinhas
por não lembrarem a cor dos passos perdidos
[só a loucura do poeta é memória sobrevivente da vida inteira:
mas de olhos cerrados
quanto é real?
BL
02.04.25
Os dias desdobram-se entre espirais
de cinza e de luz.
Nas árvores brotam segredos
[fora do tempo]
e os ventos atravessam ecos
de vozes indecifráveis.
Procuro-me num espelho quebrado
entre fragmentos que distorcem memórias
palavras fluem como rios sem destino
que vêm de terras que nunca vi.
A pele do mundo rasga-se em silêncios.
A luz dança
crua
inquieta
no cansaço das estrelas.
O vazio aproxima-se
tranquilo
como um lago a consumir a margem
sem pressa.
Sou um nome sem pátria
presa ao tempo
a desenhar flores nas páginas do amanhã
a procurar raízes onde o chão já se dissolveu
a tentar lembrar aquilo
que nunca esqueci.
Sou um nome que observa os passos da solidão
um nome que pertence ao instante infinito
e aos desertos que florescem
dentro de mim.
BL
11.04.25
Entre os ecos perdidos nas paredes
raízes rasgam brechas na pedra
e uma flor encontra o caminho da luz.
Aqui
onde o mundo desacelera
o tempo cruza ramos distantes
e o vento é sílaba insubmissa
a desenhar na pele murmúrios de silêncio.
As árvores revelam histórias antigas
na força nova onde as aves fazem morada
e a voz que busca a palavra
escreve o poema
como quem acende uma luz na penumbra
um último brilho
antes de partir.
BL
05.04.25
As casas sussurram nomes
que se perderam no vento.
Envelhecem em silêncio
tecem sombras desgrenhadas nos muros
onde hesitou o tempo.
Nas suas raízes dormem histórias
escritas sem mãos
apenas com o peso dos dias
e o eco dos passos que já não regressam.
Nas paredes existem murmúrios
palavras embebidas na cal.
E nos telhados
abre-se
muda
uma janela:
saudade
perene no que sente
intransitiva no que cala.
As casas nunca se despedem.
Apenas esperam.
BL
04.04.25
No teu olhar
um verão eterno
o brilho dourado de tardes sem fim
e
no vento
a esperança sussurrada
de uma promessa imensa
palavras verdes
sopradas.
Mas o tempo
implacável
escreve-se em silêncio
desfaz os laços
apaga as pegadas
e o amor
abrigo e horizonte
torna-se um eco
no vazio das madrugadas.
Guardo a tua voz na dobra do tempo
a memória do toque
que já não vem
e
em versos
a linguagem das aves
que me embalava.
BL
02.04.25