Dia zero
A manhã escorre pelos ouvidos. Não há sol, só rumores. Escuto o tempo como quem
lê um livro sem capa.
Coordenada perdida
As metáforas morreram ontem. Enterrei-as debaixo de uma vírgula. O silêncio floresce
melhor em terreno abandonado.
Fagulha
Escrevo como quem treme. As mãos procuram sobrevivência.
Inventário da ausência
Tenho uma bússola que aponta sempre para dentro. Cada verso que escrevo é uma
tentativa de desvio.
Ritual
Antes de escrever, acendo uma dúvida. É o meu incenso. A linguagem responde com
fumaça.
Confissão
Feri tantas palavras, tentando tocá-las. Hoje, apenas encosto o ouvido nelas.
Talvez um dia me contem o seu segredo.
Noite sem idioma
A escuridão não fala. Apenas observa. Caminho por dentro dela, como quem
aprende a silenciar a gramática dos medos.
Relatório de sombras
Há sombras que sabem mais de mim do que a luz. Seguem-me com paciência,
corrigem os meus passos. São elas que editam os rascunhos que chamo “eu”.
Epílogo
O mundo ainda existe. Talvez por causa daquele erro ortográfico que deixei
escapar.
BL
25.08.25
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