quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Des.aconchego




Chove muito por aqui
as janelas estão fechadas
os vidros embaciados encobrem o odor do verão
em parte incerta
junto a mim concentram-se os risos e os choros
e o íntimo silêncio queima
neste caminho que não é o meu.




quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Eu tinha palavras no interior dos meus olhos




Eu tinha palavras
no interior dos meus olhos mas
caminhava para dentro de mim
porque cegava-me
o enviesado da tua voz e as sombras
a caírem das tuas mãos sem lugar.

BL




quarta-feira, 23 de outubro de 2019

O teu nome


Como um pássaro pousado ao acaso

sobre os soluços das mãos. Escrevo o que sobra

do que ficou por dizer. Palavras

indecisas em superfície

branca

monólogos a evocarem a geografia das sombras.

Junto aos olhos existe um lugar

breve

na periferia de um silêncio

líquido

onde repouso o teu nome adormecido num abismo de azul.

Chove.

E a árvore sobrevive como símbolo das

coisas que atravessam

o esquecimento.



BL


sexta-feira, 18 de outubro de 2019

Também os pássaros acabam por não voltar






Já todos saíram
a pretexto e em contexto
fiquei eu só com as paredes
cobertas de memórias a retalho
e os ponteiros de um relógio a engolir o tempo.
Fecho a porta da rua
e esqueço a migração dos pássaros
e a narrativa da luz da manhã na minha pele.

BL
23.09.19






quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Na imensidão do invisível




A vida a fluir na primazia das coisas pequenas.
Digo da luz a calmaria
o azul íntimo a romper dissonâncias
e solidões.
O silêncio a arder neste mar parado
a pele vestida de memórias alinhadas
na respiração das palavras.
Janelas de entardecer a caminharem por entre o vento
na imensidão do invisível.

BL



domingo, 13 de outubro de 2019

O outro lado de abril




... e nestas manhãs frescas
de abril
entro num tempo de horas limpas
e no entanto os meus olhos
a gemerem palavras salgadas
atravessadas de silêncios
os meus olhos
num tempo a fugir de mim
cercados de vozes que morrem para além de outras horas
os meus olhos
enterrados na chuva de onde as memórias caem.




sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Plural



A s mãos em concha nas primeiras
palavras da manhã.
Anuncia-se um ruído de sombra
sentado na soleira da insónia sibilante.
Persistem os verbos partidos como o dia
desavindos como os cacos da taça sobre a mesa.

Nada de especial
afinal.

Adensa-se a chuva permanente
as cicatrizes encostadas à lógica das paredes
nos limites da linha d'água.
Os olhos entretêm-se com a movimentação da luz
e lembram a urgência das tintas
na reestruturação da voz.

Para que o silêncio nos encontre numa crença
que ainda exista em algum lugar.




BL