segunda-feira, 20 de abril de 2020

... e a voz acomoda-se




Tudo é passageiro
sei que já devia ter olhado o relógio.
Tento enganar o tempo e invento palavras
letra por letra
num diálogo a transitar entre
o sangue e o nevoeiro.
Há os dias que rasgam a memória
e as mãos procuram significados.
Mas os pontos de partida não têm
princípio nem fim
levam a lado nenhum.
Queria arrumar a mágoa num abraço
finjo que está tudo bem
não tenho para onde ir.


BL

sábado, 11 de abril de 2020

Talvez os melros cantem durante a madrugada



Os olhos estão pequeninos
pequeninos
vislumbram cada dia menos.

Talvez os melros cantem durante a madrugada
agora
a sossegarem a insónia.

Mas existem as rosas
e a terra para mexer.

A lentidão é uma dádiva
e o resto alinha-se
enquanto o silêncio se rende ao olhar.

BL
11.04.20


sexta-feira, 10 de abril de 2020

Palavras (es)partilhadas



As palavras sobrepõem-se
sem fio
nem finalidade
entretêm um tempo sem fim
e afinal é um fio de missangas
a ternura das cores
os hábeis dedinhos
que emprestam ao tempo a tranquilidade
e o significado deste tempo a prazo.



sábado, 4 de abril de 2020

Ilha




Vinha a luz
longe
gemido de sombra entranhada
nas mãos

e o silêncio a cair dos teus olhos
pequeninos do medo cercado de fogo

ilha onde morrem nomes ao acaso
desvario e espanto feitos de naufrágios.

As ervas crescem enlouquecidas
sobreviventes
no interior do vento ou no perfil
da tempestade

esperam a metamorfose do azul.

Deixo-me tocar pela incerteza das palavras
no isolamento devastador da noite.