terça-feira, 30 de agosto de 2022

Desnorte

 

Nem tanto uma noite de encanto

e de espanto.

Há gestos feridos

evitáveis

que rasgam os movimentos e espalham os ventos.

Ressoa ainda uma aparência mordaz

a simulação

incapaz de outra rota possível.

Há a mutilação da palavra

ruídos de sentidos

que as aspas não abrem nem fecham.

A bússola desfeita no ar

sem rumo

e a chuva incendeia conversas

sobre telhados de vidro.

Sinais de dor

maior e menor

vibram ocultos

desnorte

em delírios de morte

antecipada.



BL







quarta-feira, 17 de agosto de 2022

A claridade do tempo

 



Vem, enterra as palavras na terra

deita-te no silêncio das pedras do rio.

O pôr-do-sol é quase um lugar

dentro do mar.


Ouçamos a luz do dia, caminhemos juntos

entre as sombras da montanha.

Eu afastarei as escarpas, os ramos quebrados,

a escuridão do vale.


Apaga a noite por dentro.


Ao nosso lado os sonhos sorriem

seguem, seguros, o mapa dos relógios

a linha verde do luar.


Que venham as neblinas de outono

e os gemidos do vento.


A claridade do tempo

ensina-nos a respirar.


BL

03.01.11










terça-feira, 16 de agosto de 2022

A voz do tempo

 



Um incêndio ancorado

inclinado a qualquer instante

de reativação.


Avança sobre a

relva fresca

sem limites da memória

na imensidão do céu.


Atravessa o tempo

rejuvenesce

em existências sobrepostas

em idades que pertencem a lugares

onde existiu

e se entendeu.


Alimenta-se da melodia do melro

e engole as raízes mais profundas

da voz

no toque silenciado da pele.


15.08.22


BL













domingo, 14 de agosto de 2022

Desvios

 



As vozes dissolviam o nevoeiro

porque saboreavam os significados

das palavras gravadas na

parede branca.


No interior da luz

rostos atravessados de memórias

dedilhavam murmúrios de ventos


ou afetos fechados entre muros de inocência.


A tarde era um início

e o final um caminho invisível

à distância do alfabeto das horas.



BL

14.08.22




sábado, 6 de agosto de 2022

De um tempo de aves

 




Há um livro pousado sobre a mesa

e uma voz que lhe chega de um tempo de aves

ateadas de luz.


Pedra solitária

desenha num gesto

um caminho de mar. E a penumbra


consente-lhe um sorriso de pétala

em que recolhe

o desvario de asas prometidas


num diálogo de sílabas proibidas.


Assim pensou

_ proibidas _

como um rasto de cinzas e de sombras

onde nada mais existe que o negrume dos reflexos

a morrerem de sede.


BL

05.08.22