domingo, 25 de maio de 2025

Bastavas tu

 






Somente a ótica da paixão

criava o ilusório movimento do encontro.


No rosto da ilusão

cabia a dimensão eufórica

que floria num discurso de sonhos.


Eu recolhia a tua voz

e pensava em itinerários feitos

de barcos perdidos.


Bastavas tu

e a inocência das palavras

nas minhas mãos de luz.


Deixava de interrogar

a voragem do mar e a escuridão das perguntas

que o meu corpo reclamava.


Bastavas tu.

E os teus olhos tão líquidos

como o azul infinito das marés.





BL

25.05.25






sexta-feira, 23 de maio de 2025

Dizem que é de manhã

 






Dizem que é de manhã

a sala cheia de móveis e de coisas baças

a primavera amadurece


mas tu desces

em direção a outro tempo

a outras histórias.


E eu imagem de um filme mudo

estou sempre e nunca

a voz em entrelinhas


reflexão e reflexo

entre a soleira e a porta


último gesto da luz

a desfazer-se na sombra.





BL

23.05.25






quarta-feira, 21 de maio de 2025

Fazes-me falta na retina do tempo

 








Fazes-me falta na retina do tempo

um tempo de outras horas

de tardes lentas

e suspiros líquidos.


Borboletas de luz traçam órbitas

na nebulosa do pensamento

desenham trilhos de silêncio

nas margens da memória.


Lampejos onde a saudade repousa

o teu nome na ponta dos dedos

ecos antigos na pele do vento

ruídos alucinantes

como sonhos que falam noutra língua.




BL

21.05.25






terça-feira, 13 de maio de 2025

Evanescência

 




O silêncio pesa.

Um monólogo de zumbidos

sobre a pele.

O tempo dobra-se

e desfaz-se num ponto incerto.


Na memória

os passos que não dei

contornos de futuros

vozes multiplicadas por pretéritos.


Deslizam murmúrios pelo vento

fragmentos de nomes

sobrepostos.


E

no gemido solitário da noite

só a ausência me espera.





BL

13.05.25







domingo, 11 de maio de 2025

O vento murmura uma ausência antiga

 




Desvio o olhar

das mágoas que me consomem

raízes que se agarram à pele

murmúrios embebidos de vazio.



A poeira

cúmplice do esquecimento

envolve-me

desfaz contornos

dissolve vestígios

arrasta memórias

em exílio cego.



O vento murmura uma ausência antiga

um eco a deslizar nos sulcos do corpo

sombras errantes

náufragas

à deriva

na neblina espessa do tempo.






BL

11.05.25






domingo, 4 de maio de 2025

No desacato do desencanto

 




No desacato do desencanto

a árvore veste-se de insubmissão

desafia o vazio

e faz do abismo a sua morada.



Uma fúria silente

arrasta ruínas

sussurra segredos

em dialetos de nuvens.



As horas dançam

com fantasmas de fogo

o tempo joga aos labirintos

o infinito desaba

em espirais vertiginosas.



Peixes deslizam

nos espelhos partidos

e as sombras sorvem

vagarosas

a luz desfeita.



No desacato do desencanto

sou cúmplice de asas

trémulas

de mares que rugem

em sentido inverso.



E é nesse caos

nesse vórtice de absurdos

que o desencanto renasce

ofegante

e feroz.







BL

04.05.25






sábado, 3 de maio de 2025

Sob a engrenagem das marés

 






Pressinto um frio sem refúgio

nesta vertigem das palavras

casa incerta

quando as noites acordam

e atravessam manhãs encandeadas de crepúsculos.

Às vezes feitos de lâminas

lugares de ventanias onde estala a tempestade.


Os dias revolvem-se

em gestos de esquecimento


alinham-se no tempo

sob a engrenagem das marés.


As palavras

aves exiladas

deslizam pelos estilhaços da luz

num voo sem abrigo

até se desfazerem em ervas daninhas

onde a memória se escreve

a sangue e vento.


E entre os rastos do dia

sopram cânticos de cinzas

vozes de um horizonte afundado na garganta das horas.




BL

03.05.25









quinta-feira, 1 de maio de 2025

O toque do tempo

 






Hoje

pedia somente a inquieta

doçura dos pássaros

como quem mendiga ao vento

o refúgio esquivo de uma melodia

a carícia de penas

etérea

deslizando pela bruma espessa da manhã.



Queria que o céu

na sua vastidão

[ de indiferença ]

derramasse pétalas em cascatas

[ fragmentos de lembranças ]

a dançarem 

ao toque imperecível do tempo.



Que um acorde

[ áspero

ou subtil ]

dissolvesse as arestas do silêncio

[ abismo a devorar a alma ]

e fosse bálsamo

para as feridas ocultas

um murmúrio que cura

e desperta

uma esperança que voa

[ incêndio ]

na imensidão.






BL

01.05.25