quarta-feira, 17 de setembro de 2025

Fica-me no silêncio

 






Fica-me no silêncio
sussurrou a pedra.
Não havia passos.
Nem sombra.
Só a pedra
[o peso]
Guardando no frio
a forma antiga do toque.





BL

17.09.25












terça-feira, 16 de setembro de 2025

poema de segunda-feira


 



um sopro de vidro estilhaça
o tempo

escorre em véus
entre os dedos

que já não tocam


a memória descalça

caminha
pelo chão onde o azul

se esqueceu

 

há um eco

que não se cala

no fundo

da chávena vazia


o corpo desaprende

o gesto
e a sombra

aprende a ficar

 

a casa respira em branco
os móveis fingem presença


a luz hesita

no contorno
da ausência

que se senta

 

um gato observa

o nada
com olhos de quem sabe
que o mundo se parte
sem ruído





BL

16.09.25









segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Claridade de dentro

 



 

A saudade

com sabor a terra molhada

secava devagar
como pedra que chora o seu musgo
resistindo ao calor da manhã.

 

O vento tocava as folhas com ternura
e a saudade


aquela saudade enterrada na pele
abria os olhos à luz.

 

Havia claridade
feita de sombra fina
de raízes que brilham por dentro
quando o tempo as chama.

 

No sabor da terra molhada
ficavam restos de passos
e promessas germinadas


como se a ausência florescesse. 




BL

15.09.25










sexta-feira, 12 de setembro de 2025

Cântico das ruínas

 


 




Ergueste o teu destino
num claustro anónimo.

 

Rezaste às sombras.
Não te responderam.

 

Velas apagadas
pelas mãos do tempo.

 

Deixaste no altar
aquilo que não quiseste

 

ver do mundo.




BL

12.09.25




quarta-feira, 10 de setembro de 2025

O nome da luz

 





Chamaste-me

sem voz
e eu ouvi.


Ouvi
pela ausência

que deixavas em mim.

 

Segui o rasto
como quem sente o cheiro

da terra molhada.


E encontrei-te

onde o mundo termina.

No lugar

onde o teu nome começa.

 

E vinha a luz.

Partia de ti.


E eu

que já não sabia ser
aprendi a existir
porque te reconheci.




BL

10.09.25






terça-feira, 9 de setembro de 2025

Mas tu vieste

 







Fui sombra
antes de ser nome.
Caminhei entre vozes que não sabiam chamar-me.
O chão recusava os meus passos
e o céu
tão alto
parecia feito só para os que nunca caíram.

 

Mas tu vieste
com o tempo nas mãos
e o silêncio nos olhos.


Não disseste nada.
E foi tudo.

 

A tua presença era ponte
era travessia
era o sim
que o mundo me negava.

 

Deitaste-me entre as árvores
onde o vento sabe segredos antigos.


E ali
entre o murmúrio das folhas
aprendi que viver
é aceitar morrer um pouco
sempre que o amor nos chama.





BL

09.09.25




segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Última conjugação

 






Parto para o silêncio último
a morada sem janelas.
Interior.
Rocha.

 

Devagar
recolho os ecos

dos versos

que não escrevi.


Versos em espiral
os que amaram em voz baixa
os que se dobraram ao tempo.

 

Aceito as vírgulas

que me suspendem o fôlego
as sílabas que me lavam

o sal do sangue.

 

Sou agora
o intervalo entre dois verbos.


Sou
o poema que se desfaz
na boca do vento.




BL

08.09.25